segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

31 de Dezembro

Hoje é o último dia do ano. Estou trancada no escritório e agonizo entre contratos. Vou mandar mails que ninguém vai ler senão depois da ressaca e da boca seca de frustração. Daqui a algumas horas é dia de ano novo e é preciso que este Mundo se mantenha na engrenagem. Resoluções já tomei algumas, donde avulta a essencial: centrar-me em mim.

Até para o ano.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Solstício

Esta madrugada, a noite espraiou-se durante máximo lapso de tempo. Solstício de Inverno. Na minha terra, a influência pagã ainda faz com que estas noites mágicas sejam propícias aos sortilégios. Penso que a Terra, que é feminina, nos chama de uma forma quase assustadora e, curiosamente, esse chamamento é sempre prenúncio de mudança, ainda que os míopes da alma apenas o percebam pelas folhas que os fazem escorregar nos passeios calcetados.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Memórias em segunda mão

É sábado de manhã. Uma manhã soalheira e fria, invernosa. Acordei tarde e vagueio pelo Jardim do Príncipe Real, enquanto um amontoado de gente calcorreia as bancas de velharias. Desde gramofones, livros, loiças e bijutarias, tudo de expõe à passagem de gente que remexe, ávida de novidades que entre velharias se possam albergar, despojos de silêncios idos, como o são as coisas em segunda mão à espera de dono.
Gosto muito de objectos antigos. Seria, aliás, incapaz de viver numa casa mais recente do que o meu provisório estar no mundo. As coisas anteriores a mim ganham uma transcendência que quase as liberta da condição de coisas. Mas esta é outra meditação, onde hoje não me vou deter.
Na feira de antiguidades há memórias amarelecidas pela auréola baça do tempo que as marca. Há rendas, livros, objectos em marfim, bijutaria descascada e objectos kitsch para todos os maus gostos que se possam conjecturar. A estética aqui (e falando de estética em sentido filosófico), fica escudada por uma barreira que é aquela que marca os objectos pelo passar dos anos sobre eles porque, creiam-me, os objectos guardam em si a progressão imparável da História, muito para além das vivências de que, transitoriamente, sobre eles exerce o precário direito de propriedade.
Existe um monte de peças de vison e de colares. Gosto muito de ambos e se não uso mais uns e outros é por questões sociais banais demais para aqui serem convocadas. Detenho-me, porém, num colar de contas gradas avermelhadas, que ficaria a matar com uns brincos Gucci de mola que me chegaram às mãos vindos de uma outra história que um dia vos contarei. Percorro as contas com os dedos, e resisto à tentação, impondo-me o sacrifício cristão do Advento.
Sou, momentaneamente, assaltada por um desejo de pensar na mulher de cujo pescoço aquele colar terá pendido e de repente ela está ali, junto às árvores do Jardim e já é real ao ponto de me ser próxima e de o colar ser uma forma de continuidade do eterno feminino.
Esta é uma zona da cidade onde as cesuras sociais se mostram de forma mais desabrida ao olhar. Gente sem luz em casa convive, paredes meias, com famílias da dita aristocracia lisboeta que, desde os tempos dos Condes de S. Marçal e do Eduardo Coelho e da sua desventurosa filha, perduram através da política familiar das proles alargadas.
Penso nas senhoras que, domingo após domingo, encontro na Igreja de S.Mamede e que me devolvem um olhar intrigado por me desconhecerem, quer da sua banda social, quer da banda social onde praticam a caridade que a sociedade lhes impõe hipocritamente. Penso sobretudo nas mulheres que, ostensivamente abastadas, frequentam o ofício religioso rodeadas de um silêncio que escuda solidões e decepções. Quiçá um marido infiel, quiçá uma filha drogada ou uma doença da moda.
Penso que aquilo que nos traz sofrimento, estranhamente, perdura menos no espaço sideral que ocupamos que um colar de contas vermelhas e não resisto à auto-provocação intelectual de conjecturar uma feira de sentimentos demodés. Seria interessante, se bem que penso que os preços seriam bem mais elevados. Talvez eu prefira acreditar que assim seria.

Amar o próximo

«Amar o próximo como a nós mesmos e a Deus sobre todas as coisas». Com esta fórmula lapidar e sintética se resumem todos os Mandamentos da Lei de Deus que, Moisés, pacientemente, nos legou, reveladas que lhe foram por Deus no Monte Sinai.

Todos os dias, neste ridículo viver que é meu me lembro disto. Deve ser para aí a segunda coisa de que me lembro ao acordar, depois do agradecimento pelo dom da Vida. Depois de agradecer o ter-me sido concedido, por duas vezes, o dom da Vida, penso no amor ao próximo e, muito naturalmente, sem hipocrisias, peço a Deus que me conceda mais uns diazinhos de dilação.

Amor ao próximo. Deus manda amar o próximo como a nós mesmos e a Si sobre todas as coisas. Deus, que não aceita opting outs, exige ao Cristão o amor ao próximo como fim em si mesmo (porque no outro vive Ele), mas também como prova da capacidade de ser Cristão.

A minha (ignorante) interpretação desta exigência divina cifra-se nesta explicação: Deus sabe que não é fácil dizer aos outros que O seguimos e que colocamos as nossas vidas ao Seu serviço. Deus sabe que, historicamente, os Cristãos as pagaram como ninguém. Como não quer fracos ao Seu lado, formula a exigência máxima que se pode formular: amar o próximo. O próximo é, não raro, o colega pulha, a secretária incompetente, o taxista praguejador e fachista, o diminuído mental, o mal educado, o mal formado, o interesseiro, o burlão...a humanidade, onde fervilham os próximos é este amontoado de gente morta em pé, mercê, pasme-se, da liberdade que Deus nos dá e que nos torna semelhantes a Si e dignos do amor dos outros próximos.

Confusos?

Também eu. Amar o próximo. O mal do Mundo ainda percebo, porque Deus nos fez livres e, nessa medida, iguais a Si. Agora o amor ao próximo que vive paredes meias com o pecado mortal da ira...isso sim, não há ninguém que se atreva a pedir.

Só espero estar à altura e que, até lá, me seja facultado o direito a ser Cristã sob condição supensiva, até que a dilação expire.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Natal (II)

Cristo ama-te. Deus também. Por isso, buy as much as you can.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Natal

É espantoso como reagimos pavlovianamente a datas. A números que assinalam dias e que nada mais são do que uma ficção auto-imposta pela humanidade que, cautelosa, tem medo de perder a noção dos tempos (no plural, porque no singular, esta palavra significa nada).
E isto acontece com especial acuidade quando de datas de festividades católicas se trata. Curiosamente, a sociedade pós-moderna em que vivemos, reage assim.

Eu detesto datas festivas: Carnavais, Páscoas, Natais, são coisas que me exasperam. E exasperam-me a um ponto que eu só penso: oxalá que passe depressa e sem mais mazelas...

De há oito anos para cá, o meu Natal coincide sempre com: primeira leva de testes da Faculdade, prepração de aulas de mestrado, preparação dos exames à Ordem dos Advogados. Este ano, tenho a minha tese nos braços e tudo o que não seja Direito Penal vai ficar à porta do meu quarto, a bater, incessantemente, enquanto diz: quando é que sais daí?

Por todas estas razões, avizinha-se mais um Natal de luta contra o mundo, de luta contra as circunstâncias, até que a minha tese veja a luz do dia.

Oxalá passe depressa.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

domingo, 9 de dezembro de 2007

Pensamento

Vejo, vorazes, os dias a avançarem perigosamente em direcção a mais um aniversário e pergunto-me que sangue é este que me corre nas veias. Talvez nós sejamos só o interlúdio entre duas datas. Uma espécie de ócio dos deuses transformado em miséria, albergada entre o nascimento e a morte. Talvez nos venhamos a esgotar em epitáfios feitos a granel com mensagens ridículas, cujo remate são duas datas. A quo et ad quem. E depois da data ad quem, não resta nada, nem sequer o pretérito perfeito de nós. Resta o ter sido amado, para aqueles que nos choram e esta forma pretérita composta é a conjugação mais perfeita e absoluta do verbo amar, porque é a única que resiste ao fim do estar presente, coisa a que poucos amores resistem.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Preparação

Quando vamos a tribunal, estamos preparados para tudo o que possa acontecer e o que pode acontecer fica fixado num plano impossível de entender, sujeito apenas à revelação, que é o da convicção do juiz.

Estamos preparados para tudo. Nesses dias, em que o esmero com a aparência até é superior e a ansidedade atinge níveis comparados apenas com a sensação «véspera de oral na FDL», estamos preparados até para um tanque de guerra. Até ao dia em que, com mísseis comandados à distância na pasta que alberga códigos, dossiers, agendas e notas de última hora, damos de caras com alguém que, sabendo de coisas perigosas de quem nós fomos num tempo passado, nos atira com todos os nossos fracassos à cara. Para isto não há preparação que nos valha.