terça-feira, 24 de março de 2009

R., tens um detonador dentro de ti, que compassadamente marca os instantes que se sucedem até que a explosão retraída rebente debaixo da tua pele. Estás cansada de falar disso, de repetir as mesmas coisas para que as oiças (como se, por momentos, sequer, fosses capaz de esquecê-las). Andas à volta das horas dos dias, na esperança que outro tempo se suceda a este, que exista um compasso de espera no mundo, que espere um pouco para que tomes ar, te recomponhas, que coles todos esses estilhaços de ti, e depois, se ajeitasses o cabelo, se sorrisses mais, tudo correria bem. Andas tão perdida, tão esquecida de ti, tão longe de tudo, tão próxima de coisa nenhuma e, no fim do mundo onde te encontras, andas às voltas sobre ti mesma, como se isso fosse capaz de te devolver o norte e de te ajudar a descobrir o caminho de volta.

sábado, 21 de março de 2009

Poesia e Primavera

Chamo-Te porque tudo está ainda no princípio
E suportar é o tempo mais comprido.

Peço-Te que venhas e me dês a liberdade,
Que um só dos teus olhares me purifique e acabe.

Há muitas coisas que eu quero ver.

Peço-Te que sejas o presente.
Peço-Te que inundes tudo.
E que o teu reino antes do tempo venha.
E se derrame sobre a Terra
Em primavera feroz pricipitado

terça-feira, 17 de março de 2009

Onde vais, R., agora que o dia acabou de começar e procuras, sem encontrar o peso que caiu sobre o teu corpo na noite que acabou de findar? Agora que procuras equilibrar-te em cima dos teus sapatos (tão excêntricos quanto tu te proíbes de ser) em busca de mais um dia, em que esperas que da tua cabeça saia um milagre capaz de salvar o mundo? O que vais fazer às pessoas que encontrares, e que te arrastarão para conversas imbecis, sobre gente e coisas imbecis, impondo-te o silêncio altivo que tanta gente te critica? O que vais fazer, se o que queres é silêncio, e há este ruído todo dentro da tua cabeça, que está pesada, cansada disto tudo? Para onde te guiam esses passos cambaleantes, tu que já não sabes o caminho de volta para ti, que te perdeste na cartografia confusa da tua curta vida? O que vais fazer, quando um dia te perguntarem, «o que foi, R.?» e só o vazio que se alberga na palavra «nada» te ocorrer como resposta?
Estás na margem esquerda de mim, nesse terreno perigoso que desisti de percorrer, com medo de me encontrar com aquilo em que me tornei. Estás mergulhado na face mais negra de mim, onde enterrei dúvidas e esperanças, à espera que morressem, nesse lugar de onde não há ressurreição possível. És o único habitante dessa terra de ninguém, mergulhada na escuridão da minha indiferença e onde só encontras cinzas daquilo que eu fui, num tempo demasiado longínquo para sobreviver à minha memória mutilada.